A luta pela redução das tarifas do transporte
coletivo é uma reivindicação antiga do povo brasileiro, pois incide diretamente
sobre o custo e a qualidade de vida da população, sobretudo de baixa renda, que
necessita desse tipo de serviço para se deslocar no interior das grandes
cidades, ou seja, para exercer o “direito
de ir e vir”.
No Brasil, um dos primeiros movimentos de
protesto contra o aumento abusivo nos preços das tarifas dos transportes, que
se tem notícia, ocorreu no Rio de Janeiro, então capital Imperial – a Revolta
do Vintém (de 28 de dezembro de 1879 a 04 de janeiro do ano seguinte),
protesto que, segundo consta, reuniu em torno de cinco mil pessoas protestando
que clamavam as palavras de ardem “fora o
vintém!” contra o aumento abusivo das passagens dos bondes. Os protestos
foram marcados por conflitos que resultaram num quebra-quebra de bondes pela
população indignada, arrancando-os dos trilhos e virando-os ao longo da Rua
Uruguaiana, no Rio. Os confrontos e a forte repressão policial causaram a morte
de pelo menos três manifestantes e cerca de 20 feridos, provocando ainda a
queda de um ministro do Governo imperial e a revogação do aumento no preço das
passagens.
Na
imagem acima (F.1) temos um bonde à tração animal nas ruas do centro do Rio
de Janeiro (capital do Império do Brasil), em 1879, Fonte: http://oglobo.globo.com/historia/
Em Natal, capital do Rio Grande do Norte, a
tomada do poder pelos comunistas, durante a Insurreição de 1935 –
levante armado deflagrado na noite do dia 23 de novembro se estendendo por toda
madrugada e manhã do dia seguinte –, o Governo Popular Revolucionário,
recém-empossado, determinou como uma de suas primeiras medidas, logo após
consolidada a tomada da Capital pelos rebeldes, a imediata redução nos preços
dos alimentos e das passagens dos bondes (de 50 para 20 Reis) que servia à
população da cidade. Porém, após sofrer grande derrota nos combates às forças
legalistas, reacionárias e contra-revolucionárias, na Serra do Doutor, nos
enfrentamento com milícias fortemente armadas pela resistência conservadora
coronelista seridoense, na madrugada do dia 27 de novembro chegava o fim a primeira
experiência de governo popular-socialista em terras brasileiras.
Há anos que a juventude brasileira incorporou
a questão da redução do preço das passagens em sua pauta de luta
reivindicatória, sendo esta uma importante bandeira de luta do movimento estudantil
ao longo de sua história.
Em maio de 1956, ocorreram manifestações
estudantis de protesto contra o aumento no preço das passagens dos bondes no
Rio de Janeiro, Capital Federal, convocadas pela União Nacional dos Estudantes
(UNE). O movimento recebeu o apoio popular e adesão de trabalhadores e
sindicatos, aliança estudantil-operária criadora do movimento conta à carestia. Os estudantes foram reprimidos com violência
pela policia carioca que solicitou reforços do Exército para combatê-los,
causando a morte de uma pessoa. A sede da UNE, localizada na Praia do Flamengo,
foi invadida e houve prisões de lideranças estudantis. Após uma semana de intensas
manifestações, protestos e confrontos, o Presidente JK convidou as lideranças
estudantis a negociar uma solução ao impasse.
Em 1958, em são Paulo, noutro movimento de
protesto contra o aumento abusivo das passagens de ônibus e bondes, a
truculenta repressão policial causaria a morte mais de quatro manifestantes e
dezenas de feridos.
Nas imagens acima, temos momentos diferentes dos protestos
estudantis cariocas e paulistas, respectivamente, onde a juventude indigna-se,
sai às ruas e protesta contra o aumento abusivo das
passagens dos transportes coletivos. Na primeira (F.2), vemos estudantes cariocas
dançando sobre os trilhos da estação de bondes, nas manifestações estudantis de
maio de 1936; e, na segunda (F.3), temos estudantes paulistas realizando ato
público no centro da cidade, em 30 de novembro de 1958. Fonte: http://acervo.estadao.com.br/noticia.
Em 1979, ainda sob a Ditadura Militar, após
três aumentos consecutivos no preço das passagens de ônibus, pela Prefeitura de
São Luís (MA), estudantes secundaristas e universitários travaram uma ousada e obstinada
luta contra o aumento abusivo das tarifas, reivindicando o direito à meia
passagem nos transportes coletivos, movimento que ficou conhecido como a Greve
da Meia-Passagem (ou Greve de 1979), ocorrido no período de 14 a 22 de
setembro daquele ano. O movimento foi
marcado por forte adesão estudantil e popular, com manifestações de ruas (atos,
assembleias, passeatas, confrontos) e pela truculenta repressão policial.
Felizmente os estudantes maranhenses saíram vitoriosos, conquistando,
pioneiramente no Brasil, o benefício da meia passagem.
A coragem e ousadia da juventude maranhense na
memorável Greve de 1979 simbolizam,
não apenas um marco importante na história de luta do movimento estudantil,
mas, sobretudo, a retomada das ruas pelo povo brasileiro, reprimido e
massacrado por anos de Ditadura. Foi o princípio do fim do decadente regime
militar que se manteve no poder pela força das baionetas, perseguições,
cassações, torturas, mortes e desaparecimentos políticos de lideranças políticas
e estudantis. Foi “a ponta de lança da luta pelo fim do regime dos generais.”
(http://maxsuelubes.blogspot.com.br/2010).
Acima, dois momentos importantes da Greve de 1979,
em São Luís do Maranhão: Na primeira imagem (F.4) vemos estudantes maranhenses e
populares em passeata nas ruas de São Luís; e, na segunda (F.5), temos uma
imagem impressionante do acirramento da luta, dos enfrentamentos e da radicalização
do levante popular-estudantil.
Com o fim da Ditadura, as organizações e
entidades juvenil-estudantis (UNE, UBES, DCEs, Grêmios, UJS, dentre outras)
retomaram a luta pela conquista do direito a meia-entrada em eventos culturais,
desportivos e de lazer, e da meia passagem nos transportes urbanos, intermunicipais
e interestaduais, bandeiras de luta parcialmente incorporadas ao
recém-sancionado Estatuto da Juventude
(Projeto de Lei sancionado no dia 05 de agosto último, pela presidenta Dilma
Rousseff, após nove anos de tramitação no Congresso Nacional), tendo em vista o
veto presidencial ao artigo que garantia o direito à meia passagem no
transporte coletivo interestadual para jovens entre 15 e 29 anos. Recentemente,
a partir dos protestos juvenis de junho (de 2013), tem ganhado força a proposta
de luta pela conquista do passe livre para estudantes nos transportes
coletivos.
Nas últimas duas décadas, inúmeras manifestações
populares (estudantil-juvenis) de protesto ocorreram em todo país, organizadas
pelo movimento estudantil e/ou entidades juvenis, seja contra os frequentes
aumentos abusivos nos preços das passagens, seja pela ampliação dos direitos (à
meia-passagem e ao passe-livre), dentre as quais, destacamos: os protestos e
paralizações ocorridos em Salvador (BA), em 2001 (conhecidos como a Revolta
do Buzu); os protestos em
Florianópolis (SC), em 2004 e 2005 (a Revolta das Catracas); as manifestações de protestos e
ocupações ocorridas em Natal (RN), em 2011 (o “Fora Micarla”), entre outras –, precursoras da
recente onda de protestos da juventude brasileira, em curso, assunto que
abordaremos no próximo capítulo de “O Despertar da Juventude Brasileira” (Parte
II).
Caicó/RN, 14 de agosto de 2013.
*Hugo
Martins de Souza, presidiu a União Estudantil de Caicó (UEC) no início da
década de 1990, onde organizou atos públicos e manifestações locais de protesto
pelo “Fora Collor”. Atualmente é Professor de Geografia, do Ensino Fundamental
e Médio, atuando no movimento sindical no SINTE/RN, desde 2003.
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