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quinta-feira, 3 de outubro de 2013

O Despertar da juventude (Parte III)

“Da inércia para o movimento basta um pulo”

Por: Hugo Martins de Souza*

Com estas belas palavras, extraídas de um manifesto do movimento #ForaMicarla, publicado no dia 17 de junho, continuemos nossa análise sobre a vitoriosa luta travada pela juventude potiguar natalense, em 2011.
As manobras políticas da bancada governista na Câmara Municipal de Natal (CMN), referentes à composição da Comissão Especial de Inquérito (CEI) criada, em maio de 2011, para apurar denuncias de irregularidades nos contratos de locação de imóveis firmados pela Prefeitura Municipal de Natal (PMN), contribuiu para aumentar, ainda mais, o clima de insatisfação popular e, consequentemente, o acirramento da luta juvenil nos embates de rua e nas redes sociais. Paralelo a isso, em âmbito estadual, o Governo Rosalba Ciarlini (DEM-RN) enfrentava, há menos de seis meses no poder, uma das maiores ondas de paralizações da história política potiguar, com 14 categorias em greve. O Estado do RN encontrava-se paralisado.
A partir de então, a luta popular na capital potiguar ganharia novo impulso com a dinâmica impingida pelo movimento #ForaMicarla que se articulara e se propagara nas redes sociais disponíveis na internet (no Twitter, principalmente, e nas comunidades do Orkut, no Facebook, nos blogs, no YouTube, entre outras) de forma independente, reivindicando o impeachment da prefeita Micarla de Sousa, embates que logo sairia do campo virtual e ganharia as ruas de Natal.
A primeira grande manifestação do #ForaMicarla ocorrera no início da noite do dia 25 de maio de 2011, onde cerca de dois mil manifestantes (em sua maioria jovens estudantes universitários e secundaristas) ocuparam as ruas principais da capital potiguar – cruzamento da Av. Senador Salgado Filho com a Av. Bernardo Vieira (defronte ao Shopping Center Midway) –, conduzindo faixas, cartazes, bandeiras, promovendo apitaços e entoando palavras de ordens (como "O povo está na rua, Micarla a culpa e sua!"...), recebendo o apoio popular, expresso nos constantes buzinaços dos veículos que trafegavam nas avenidas opostas. A manifestação encerrara por volta das 20h debaixo de chuva, quando os manifestantes seguiram da Av. Salgado Filho até a Prudente de Morais concentrando-se em frente ao Hiper Bom Preço.
O segundo ato público do #Fora Micarla reuniu cerca de duas mil pessoas na noite do dia 1º de junho, saindo das imediações do Condenadão (denominação dada ao estádio Machadão, prestes a ser demolido para copa de 2014), paralisando a BR 101 e Av. Engenheiro Roberto Freire, indo até as imediações do Praia Shopping, em Ponta Negra.
F.1 - Ocupação da BR 101 em 1º de junho de 2011

A terceira, e mais importante manifestação, foi realizada numa manhã chuvosa do dia 7 de junho, onde cerca de 200 manifestantes saíram com determinação da Praça Cívica, em Petrópolis, em caminhada entoando palavras de ordens (“mãos ao alto dois e vinte é um assalto..., iii Fora!”, “Quem não pula quer Micarla”...) pelas ruas principais do centro histórico da cidade com destino ao Palácio Felipe Camarão, na cidade Alta. Diante da sede da Prefeitura Municipal de Natal (PMN) os manifestantes do movimento #ForaMicarla foram impedidos pela Guarda Municipal de adentrar no prédio. Daí, então, saíram com entusiasmo, ousadia e determinação  rumo ao Palácio Padre Miguelino, sede da Câmara Municipal de Natal (CMN), no Tirou, pedindo a instalação da CEI dos Contratos superfaturados e o “impetchment” da prefeita Micarla.

Dois momentos importantes da manifestação do dia 07/06/2011:
F.2 - Protesto diante da sede da PMN e F.3 - Ocupação da CMN
Chegando à sede do Legislativo municipal a juventude decide então pela sua ocupação por tempo indeterminado - uma das mais bem-sucedidas estratégias de resistência popular da história política norte-riograndense –, como forma de pressionar e cobrar dos parlamentares o funcionamento da CEI dos aluguéis, atitude que, dois anos depois (em 2013) seria utilizada pelos movimentos populares país a fora.
Por onze dias (de 07 a 17 de janeiro de 2011) a Câmara Municipal de Natal mantivera-se ocupada, servindo de abrigo à mocada natalense amotinada. A juventude indignada protagonizara um enclave, montando ali seu quartel-general de campana, sua trincheira de luta, seu acampamento, por eles batizando sarcasticamente de “primavera sem borboleta” – “primavera”, em alusão ao levante pacífico da juventude nos países do Norte da África e Oriente Médio, que se processava (denominado “Primavera Árabe” pela imprensa burguesa); e “borboleta” porque tal inseto fora sido utilizado como símbolo da campanha eleitoral (de 2008) da então candidata Micarla de Sousa.
Os estudantes abdicaram ao aconchego do lar e à rotina escolar a aventura-se no convívio coletivo e solidário d@s companheir@s, lançando-se de corpo e alma à responsabilidade histórica de conduzir os destinos de seu povo, dividindo o mesmo chão, o mesmo pão e compartilhando as mesmas esperanças; superando o individualismo, o egoísmo e o consumismo; combatendo inimigos poderosos e cultivando a esperança; compreendendo na plenitude o significado real de solidariedade, fraternidade e abnegação; renunciando às diferenças (político-ideológicas), fortalecendo-se mutuamente no exercício pleno do companheirismo e extravasando, juntos, um grito de vitória.
Os embates políticos travados nas jornadas juvenis de junho de 2011, em Natal, se radicalizariam, ainda mais, quando, no terceiro dia de ocupação da CMN (dia 10 de junho), o presidente daquela Casa Legislativa, vereador Edivan Martins (PV-RN), determinou a extinção da CEI dos contratos. Tal atitude arbitrária contribuíra para aumentar a indignação e a determinação, por parte da juventude, em manter a ocupação a qualquer custo.
É certo que a juventude sublevada sofrera pressões de toda sorte, desde ações judiciais pedindo a desocupação da Câmara Municipal, a ameaças recorrentes do uso da força policial para evacuar o recinto. Mas, o apoio popular e a solidariedade dos movimentos sociais reforçaria a determinação obstinada da juventude em resistir até o fim.  O apoio espiritual (as palavras de apoio, as felicitações e os incentivos), o auxílio material (em alimentos) e o imprescindível assessoramento jurídico, recebidos durante todo o processo de ocupação, foram de fundamentais!
Uma página inesquecível dessa luta ocorrera no dia 09 de junho quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedera um Habeas Corpus assegurando a permanência da ocupação e revogando a ordem judicial de desocupação do prédio. O anuncio da conquista soou como vitória parcial da resistência comemorada e festejada numa explosão de alegria coletiva pela juventude amotinada. Nos quatro cantos da cidade ecoava-se o coro patriótico da juventude insurgente entoando a toque de tambores o Hino Nacional brasileiro, momento ímpar de felicidade coletiva sem igual que para sempre ficará marcado na memória da galera.
A moçada guerreira que ocupara o prédio da CMN permaneceria ali amotinada por vários dias, num ambiente fecundo de fraternidade, democracia, respeito, solidariedade e luta, afirmando ser “possível chegar longe através de uma ação política pacífica, plural, não-violenta, democrática, horizontal e autogestionada” (Movimento #ForaMicarla, junho de 2011), até que, numa histórica sexta-feira (17), com a mediação da OAB, selava-se o tão almejado acordo que solucionaria o impasse, segundo o qual o movimento se comprometeria com a desocupação do prédio em troca da criação de uma nova CEI dos Contratos superfaturados.  
Os estudantes natalenses que participaram do Coletivo “#ForaMicarla”, dada à conjuntura histórica favorável e em sintonia com a onda mundial de protestos juvenis que se processava, empunharam sem tergiversar a bandeira de luta e foram às ruas, prenuncio do levante juvenil de 2013 que sacudiria o país mais uma vez,  pioneirismo compartilhado ao concomitante movimento de protesto juvenil que se processava simultaneamente no Norte da África e Oriente Médio (iniciados na passagem 2010/2011), atingindo a velha Europa (entre maio/junho de 2011) e que, como um relâmpago, transporia o Atlântico e chegaria ao Novo Mundo, primeiramente ao Chile (em junho) e dias depois aos Estados Unidos (em setembro/outubro), assunto que abordaremos com detalhes no próximo capítulo de “O Despertar da Juventude (parte III).”

Caicó/RN, 1° de outubro de 2013.

* Hugo Martins é professor do Ensino Fundamental e Médio, dirigente sindical e militante dos movimentos sociais.






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