Separando o joio do trigo!
Para compreender
melhor a natureza histórica das transformações sociais que se processam nos
países árabes, conhecida como “Primavera
Árabe” - denominação difundida pela imprensa conservadora internacional,
alusiva à Primavera de Praga, para se
referir ao levante popular de contestação à ordem vigente deflagrado no final
de 2010 e em 2011 nos países do Norte da África e Oriente Médio –, é
fundamental que façamos, antes, uma reflexão sobre as diferenças,
peculiaridades e características da natureza (popular ou conservadora) das
mudanças preconizadas pelo movimento insurgente ocorrido em cada país especificamente,
afim de não incorrer no grave erro de realizar generalizações vazias que não
condizem com a realidade concreta dos fatos.
Os avanços, conquistas
e vitórias populares ocorridos em alguns países árabes foram obtidos graças à atuação
militante e ao poder de organização, articulação e mobilização social da
juventude que sabiamente explorou politicamente o extraordinário potencial das
novas tecnologias da informação e comunicação – as mídias eletrônicas
alternativas ou redes sociais disponíveis na internet (o twitter e o facebook, especialmente), além do uso de aparelhos celulares - recursos amplamente utilizados nas mobilizações
populares fundamentais para precipitar a queda de
ditaduras oligárquicas há décadas no poder.
O
sentimento e o anseio popular por mudanças e liberdades individuais e sociais
no mundo árabe, em se tratando de países de pouca (ou nenhuma) tradição
democrática, deram ao movimento insurgente uma conotação revolucionária adquirindo uma
força avassaladora com manifestações de proporções gigantescas.
Como uma fagulha no palheiro a conquista da vitória da
insurreição popular tunisiana associada à justeza dos ideais democráticos
preconizados pelo movimento contestatório rapidamente se propagou pelos países
árabes da Norte da África e Oriente Médio, região marcada pelo autoritarismo de
dinastias corruptas conservadoras cristalizadas no poder. O movimento
insurgente iniciado na Tunísia se propagou numa gigantesca onda de revoltas
populares que atingiria também a Argélia, a Líbia, o Iêmen, o Egito, a Síria, o
Iraque, Barein, Kuwait, entre outros.
Em Alguns países (como
Tunísia, Egito entre outros) o movimento assumiu um caráter popular tencionando com o
governo nos embates de rua que explodiriam em grandes manifestações nacionais de protestos
contra o poder constituído culminando como a queda de ditaduras. Noutros
(como Líbia e Síria) o sentimento popular de mudança fora abortado pela ação
oportunista de milícias rebeldes que se lançaram (puro engodo!) como defensores
da liberdade e da democracia aliando-se e deixando-se cooptar pela “ajuda” bélico-militar das potencias ocidentais imperialistas (estadunidenses e europeias)
inimigas externas do governo de seus países.
Quanto às causas (à gênese)
históricas do levante deflagrado em 2011 no mundo árabe é preciso que se façam
algumas considerações importantes: em primeiro lugar, há de se reconhecer um
fator comum em relação ao quadro político geral dos países do Norte da África e
Oriente Médio que se constituíram como estado-nações a partir do processo de
descolonização (africana e asiática) ocorrido em sua maioria após a Segunda
Guerra Mundial. O poder político na maioria dos “jovens” estados árabes, recém-libertados
do julgo colonial das potências europeias, passou a ser exercido por uma elite
oligárquico-conservadora mantida pela força das armas que reprimia com rigor
e violência qualquer possibilidade de participação popular.
Em segundo lugar,
quanto ao caráter do movimento de contestação em processo nos países árabes é
preciso separar o joio do trigo. Não devemos confundir o movimento pacífico de
caráter popular-democrático com a atuação armada de milícias minoritárias de
oposição pró-imperialistas de caráter conservador apoiadas pelas potências
ocidentais (europeias e norte-americanas) intervencionistas.
No caso da Líbia os protestos contra o governo do ditador Muammar Al Kadhafi, inimigo externo das potências ocidentais, iniciaram-se em fevereiro de 2011, logo evoluindo para uma guerra civil. Neste, as forças rebeldes minoritárias em armas foram beneficiadas pelo apoio bélico-militar e pela intervenção armada da OTAN com o aval* do Conselho de Segurança da ONU, garantido a conquista, a ocupação e a vitória dos rebeldes que ascenderam ao poder em troca da submissão política e da perda da soberania nacional.
No caso da Líbia os protestos contra o governo do ditador Muammar Al Kadhafi, inimigo externo das potências ocidentais, iniciaram-se em fevereiro de 2011, logo evoluindo para uma guerra civil. Neste, as forças rebeldes minoritárias em armas foram beneficiadas pelo apoio bélico-militar e pela intervenção armada da OTAN com o aval* do Conselho de Segurança da ONU, garantido a conquista, a ocupação e a vitória dos rebeldes que ascenderam ao poder em troca da submissão política e da perda da soberania nacional.
O triunfo dos
rebeldes no caso da Líbia consagrou os interesses estratégicos geopolíticos e
geoeconômicos das potencias ocidentais num dos maiores produtores mundiais de
petróleo. Ao final do conflito, o
ditador Kadhafi, ferido em combate, seria abatido no dia 20 de outubro em meio
aos rebeldes que o capturaram.
Na Síria os protestos,
iniciados em 2011, logo evoluíram para uma guerra civil contra o governo do
presidente Bashar Al Assad que tem enfrentado forte oposição interna, pela ação
armada de milícias rebeldes, e externa, através de ameaças de intervenção militar
das potências ocidentais.
Os rebeldes acusam o “Ditador” Assad pela autoria do
lamentável ataque à população civil com armas químicas (gás sarin) ocorrido na
madrugada do dia 21 de agosto (de 2013) na periferia de Damasco causando a
morte (o genocídio) de centenas de civis inocentes. O governo sírio, por sua
vez, se defende das acusações culpando os rebeldes pelo covarde atentado
terrorista à população civil indefesa com o intuito de incriminá-lo (argumento defendido
pelo governo russo) a fim de justificar a intervenção bélico-militar por parte das
potências ocidentais através da OTAN contra a Síria, assim como ocorrera com a
Líbia.
Sua história recente tem sido marcada por conflitos armados, como: a Guerra Irã-Iraque (1980 a1988), motivada por disputas territoriais e hegemonia regional, onde o Iraque, sob o comandado do ditador Saddan Hussai (então aliado de Washington), recebera apoio das potências ocidentais; em seguida, por duas vezes consecutivas num intervalo de pouco mais de uma década, o país enfrentaria a mais poderosa, letal e destrutiva máquina de guerra do mundo, a OTAN sob o comando dos Estados Unidos, a Guerra do Golfo (em 1991) e a dita “Guerra do Iraque” (de 2003 a 2011).
Nesta, além da enorme
perda humana e material (a destruição quase total da infraestrutura iraquiana),
o país mergulhou numa profunda crise econômico-social e política sem
precedentes, estando atualmente à beira de uma sangrenta guerra civil entre
facções rivais de consequências imprevisíveis.
Felizmente, o
verdadeiro e legítimo caráter da revolução democrática protagonizado pela
juventude árabe, iniciada em 2011, é pacifico. A coragem e ousadia da juventude
árabe sublevada têm influenciado e motivado os povos doutros cantos (da Europa,
da América e América Latina) desencadeando o reflorescimento e a retomada das
ruas pelos movimentos sociais juvenis numa irresistível onda internacional de
protestos populares, despertando um sentimento coletivo de repúdio, contestação
e rebeldia contra o decadente sistema capitalista causador de guerras e crises
econômico-social-ambientais que afligem a humanidade.
*O Conselho de Segurança da ONU aprovou, em
2011, uma sanção imposta à Líbia através da ratificação do pedido de criação da
chamada Zona de Exclusão Aérea sobre a Líbia com o álibi de defender a
população civil, medida intervencionista que atentou abertamente contra a
soberania daquele país, assegurando a conquista e a ocupação territorial pelos
rebeldes e contribuindo de maneira decisiva para precipitar a derrota da
resistência das forças leais ao ditador Kadhaf.
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